domingo, 6 de dezembro de 2009

Encantado

Encantei-me com os sons da cidade. Procuro olhares tão perdidos quanto os meus. Só miram a frente. Passo por construções antigas. Beleza que, para seus donos, é aparentemente imperceptível. Ouso inclinar-me a ensinar o saborear.
Vejo profissões das mais diversas. Prendo-me, por um segundo, à beleza da catedral ao longe. Percebo que já está incorporada no cotidiano desses que passam ao meu lado.
Incomoda-me não ouvir conversa. Não noto interação. A expressão, que permito-me chamar de arte, concretiza-se em marcas. Ninguém fala, não o ousa. Mas os olhares por segundos, se conversam. Um sorriso estaria perdido.
As árvores, admiravelmente, não se deixam sufocar pelo concreto. Cães, perdidos, sempre encontram amizade nas ruas. Os mendigos, um momento de aconchego pelos cantos. O turista, beleza.
Ao meu redor, pessoas atrasadas, concentradas em si mesmas. ”Vamo! Vamo! Vamo!”. Outras escrevem tranqüilas, dormem, trabalham...
Quando ouvi sons que não vinham dos ônibus, businas ou vendedores ambulantes. Era mais denso, parecia não caber naquele lugar. Um som desesperado e forte. Não se fragmentava em situação alguma... Era um, e tornava-se único à medida que me aproximava.
Emocionante deparar-me com a bandeira do Brasil e aproximar-me do hino nacional, cantado pela multidão. Parecia apaixonada por palavras, gritadas com convicção e firmeza. Respondia com gritos, fogos, aplausos e olhares fixos. Presa a orações sempre dirigidas a uns tais “Cidadãos de São Paulo...Cidadãos de São Paulo!”
“Greve” era o que eu via escrito nas mãos cerradas com força e na fachada da mais bela igreja. As pessoas, e até eu, pareciam perder a noção da imensidão da Catedral. Pareciam não se sentir pequenas, miúdas e insignificantes ali ao lado. Agora, o que eu via era um imenso lençol, com um só grito, aparentemente uma só vontade. Ali, naquele momento e naquela específica situação, tornava-se algo gigantesco. A Catedral era o menor elemento, o quase insignificante.
Cheguei ao metrô, na Estação da Sé, ouvindo “Uma vitória do povo! É isso que nós queremos!”. Nós? Povo? Descendo as escadas deixava, aos poucos, aquela beleza. Onde senti não caber me integrar.

Thaís dê V Lopés
01/11/08

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